E assim foi quando, aos 36 anos, descobri o meu TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade), depois
de uma odisseia de treze anos de tratamentos, diversos e numerosos, a partir de
diagnósticos controvertidos e vagos. Tudo isto instigado por uma incessante
busca de repostas e de alívio para o que eu sentia. Algo como desatenção,
hiperatividade e impulsividade, que se manifestavam, sorrateiro e sem
permissão, no meu dia-a-dia, nas minhas ações e decisões e nos meus pensamentos.
Enfim encontrei-me,
incidentalmente, quando um perspicaz neurologista, depois de escutar todas as minha queixas, disse-me: "tome esse remedinho aqui e depois me conte como se
sentiu". Um remedinho? Sim! Mas não qualquer daqueles, como tantos
que já haviam me receitado os mais diversos médicos. Era destinado, especificamente,
para tratamento do TDAH.
Já nos primeiros dias de
tratamento, aquela minha visão míope – de mim mesmo e de como enxergava o mundo
– ganhou nitidez de uma TV FULL HD. Senti,
então, uma premente necessidade de saber um pouco mais sobre o TDAH. Acessei
blogs, procurei livros e artigos sobre o assunto. A cada leitura eu me identificava
em todos os detalhes; era o reflexo do meu ser. Os sintomas e suas
consequências positivas e negativas no trabalho, na família, na escola, na
faculdade, nos relacionamentos e até na minha vida financeira se encaixavam como
chave e fechadura. Os aconselhamentos, que minha antiga terapeuta havia me passado
durante longos anos, começaram a fazer sentido, embora ela nunca tenha aceitado
que eu tivesse TDAH, assim como não via com bons olhos o uso de medicamentos.
E esse foi o ponto de partida, o
início para a modificação de condutas e pensamentos erráticos e de sofrimentos,
que se acumulavam há mais de três décadas. Uma vida não compreendida e cercada de
incompreensões, tornando-se mais clara e definida. O medicamento certo, na
dosagem certa, e uma sede de conhecer a mim mesmo me fizeram caminhar para um
tratamento efetivo, para algo que tinha nome e corpo: o TDAH.
Respeito a opinião daqueles que se
posicionam contra a utilização do tratamento farmacológico, insistindo em
outros meios alternativos apenas parciais, e, quase sempre, pouco eficientes.
Entretanto, percebo que, para alcançarmos uma vida mais feliz e satisfatória, com esse nosso cérebro carente de um funcionamento neurobioquímico adequado, necessitamos
de um tratamento que englobe, simultaneamente:
1. AUTOCONHECIMENTO. “Conhece-te
a ti mesmo" já dizia o grande filósofo Sócrates. Na base de todo o tratamento está
a necessidade e utilidade da consciência do nosso funcionamento cerebral
diferenciado, com seus pontos positivos e negativos. Esta é a chave para abrir
a porta de um mundo novo, fascinante, instigante e, por vezes, reconfortante. O autoconhecimento nos
possibilita realçar nossos pontos positivos e tratar os pontos negativos.
Viabiliza, ainda, colocar em prática as outras duas partes da trilogia do tratamento
do TDAH.
2. MODULAÇÃO DO PENSAMENTO - COMPORTAMENTO (TERAPIA). O
TDAH, em sua essência, é causador de desordem na organização, planejamento,
coordenação de nossos pensamentos e na execução de nossas ações, bem como interfere,
negativamente, em nosso estado psicoemocional.
A modificação do comportamento de adaptação dos pensamentos negativos e de menos-valia é um processo continuo não linear, com alguns períodos de estagnação na melhora e outros de enorme superação. É uma busca pessoal, por esforço próprio, embora auxiliado por um especialista cognitivo-comportamental (melhor ainda se especialista em neuropsicologia ou TDAH). A missão dele é nos dar o suporte técnico adequado, visando o auxiliar no aprimoramento de pensamentos, sentimentos e funções executivas (planejamento, organizacão, autorregulação, etc). Tais elementos tornar-se-ão ferramentas de enfrentamento eficaz para resolução de problemas (complexos ou do cotidiano) e na neutralização de antigos maus hábitos e traumas, os quais se enraizaram devido a fracassos em vários âmbitos da nossa vida TDAH.
3. ESTABILIZAÇÃO DO FUNCIONAMENTO
NEUROBIOQUÍMICO (MEDICAMENTO). O TDAH tem como origem um desequilíbrio da química cerebral,
que afeta negativamente nossas funções executivas e nosso emocional. Numerosos
estudos científicos trazem essas explicações. É, também, um transtorno de
índole comportamental. Disso os especialistas não têm dúvida, nem eu. Mas este
fato não afasta ser, uma disfunção fisiológica – neurobioquímica –, a sua causa.
Numa singela metáfora com elementos do nosso mundo informatizado, podemos
dizer que, embora o problema da nossa máquina (nosso ser corporificado) se manifeste no software (comportamentos, pensamentos e
sentimentos), quem o está causando é um defeito no hardware (cérebro). Por
isso, não adianta apenas restaurar o sistema ou reinstalar o software (fazer terapia) sem consertar o
hardware defeituoso (tomar o medicamento).
O avanço tecnológico da
farmacologia tem sido promissor para o tratamento de doenças e disfunções que
afetam o cérebro. Atualmente, temos boas
alternativas medicamentosas para tratamento do TDAH. Assim, com o farmaco certo, na dose certa, podemos ter a base para um tratamento efetivo, que nos
conferirá vida digna e de qualidade.
Esses três juntos podem ser
considerados, na minha visão, a trilogia do eficaz tratamento para o TDAH, sobretudo quando identificado
somente na idade adulta.
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